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O encontro e o desencontro na era digital: considerações complementares sobre a “tinderização” das relações.

            Se o fenômeno da “tinderização”, como discutido anteriormente, revela faces de efemeridade, narcisismo e individualismo extremo, por outro lado, ele também abre espaço para novas configurações de afetos e para o surgimento de possibilidades que escapam às estruturas tradicionais das relações amorosas e sexuais. É necessário, portanto, ampliar o olhar para esse fenômeno, investindo em uma reflexão mais aberta sobre as ambiguidades e potências da experiência mediada digitalmente. Em tempos nos quais a fragmentação do cotidiano, a sobrecarga de informações e o “tempo rápido” das redes parecem impossibilitar o vínculo, o florescimento dos aplicativos pode ser entendido também como resposta à solidão urbana e à busca legítima por pertencimento. Aplicativos de encontros fornecem meios democratizados de acesso a novos círculos, propõem uma espécie de “vitrine” da diversidade humana e permitem que indivíduos com interesses ou orientações antes invisibi...
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A “tinderização” das relações: o que os apps de encontro nos dizem sobre amar hoje.

    Você já parou para pensar no que o Tinder — e outros aplicativos de relacionamento — revelam sobre como nos relacionamos hoje? Muito além de uma ferramenta para marcar encontros, essas plataformas escancaram algo mais profundo: a forma como o amor, o desejo e os vínculos se transformaram na era da velocidade, da hiperconexão e do consumo afetivo. A gente vive o que o sociólogo Zygmunt Bauman chamou de modernidade líquida: tudo muda rápido, nada parece durar muito, e as relações humanas entram nessa mesma lógica. Os vínculos estão mais frágeis, menos comprometidos, mais “descartáveis”. E o Tinder é quase um símbolo disso. Deslizar para a direita ou para a esquerda se tornou uma metáfora do quanto passamos a escolher — e também a excluir — pessoas com um simples movimento de dedo, como quem escolhe uma roupa ou um filme na Netflix. Nesse contexto, como fica o amor? Como lidar com esse desejo de conexão em um ambiente em que tudo parece girar em torno da performance, da image...

Mais Que Palavras: como a escuta psicanalítica desvenda os segredos da sua mente?

  Você já sentiu que há algo em você que não consegue nomear? Uma angústia que não sabe de onde vem, um padrão que se repete em suas relações, ou até mesmo um sonho que te deixa intrigado? Na correria do dia a dia, raramente paramos para realmente escutar o que se passa em nosso universo interior. É exatamente aqui que a psicanálise entra em cena. Para ela, a palavra vai muito além de uma simples ferramenta de comunicação consciente. Ela é o próprio terreno fértil onde o seu inconsciente se expressa, se revela e, finalmente, se transforma. Vamos entender como? Na psicanálise, quando você fala – seja no divã ou na poltrona do analista – cada palavra é um ato psíquico . Elas não são apenas relatos de fatos ou opiniões; são como emissários carregados de história, de desejos inconscientes, de pulsões que você talvez nem saiba que tem, e até mesmo de defesas que seu ego criou para te proteger. Pense no sintoma , por exemplo. Aquela ansiedade inexplicável, uma dor crônica sem causa apar...

Além do brinquedo: o que os bebês reborn revelam sobre nossas necessidades emocionais.

         O impacto dos bebês reborn — bonecas confeccionadas com notável precisão estética, que imitam recém-nascidos com impressionante realismo — vai além do mero colecionismo ou do brincar simbólico. Esses objetos, dotados de detalhes que evocam não apenas a aparência, mas também a vulnerabilidade de um bebê real, tocam dimensões psíquicas profundas de seus cuidadores e admiradores, muito além do que sugere sua forma física. Sob o olhar da teoria do apego, proposta por John Bowlby, é possível compreender como a interação com essas bonecas mobiliza processos inconscientes ligados à criação, manutenção e, por vezes, à tentativa de reparação de vínculos afetivos.     Para Bowlby, os seres humanos carregam, desde o nascimento, uma predisposição biológica para buscar proximidade e proteção junto a figuras de apego. Essa necessidade, de origem evolutiva, é essencial à sobrevivência e não se esgota na infância — persiste e se transforma ao longo da vida, a...

Elaborar para existir: a saúde mental como processo psíquico vivo.

      A saúde mental, sob o prisma da psicanálise, vai muito além da simples ausência de transtornos. Trata-se, na verdade, de um processo psíquico vivo, denso e profundamente elaborado, que não encontra repouso na quietude, mas pulsa na capacidade de transformar o caos da experiência humana — aquilo que Bion chamou de “elementos beta”, sensações e afetos brutos, ainda sem forma — em algo pensável, em “elementos alfa”, dotados de sentido e capazes de se integrar ao tecido do inconsciente e da consciência.     Essa transformação exige a presença de uma função psíquica interna que funcione como continente, algo que se estrutura nas nossas primeiras trocas afetivas. A escuta, o acolhimento e a disponibilidade emocional dos cuidadores iniciais — sobretudo a função materna, simbolizada pela “mãe continente” — moldam o aparato psíquico que nos permitirá conter e processar angústias e frustrações. É a partir dessa base que o bebê — e depois o adulto — pode construir um...

Breadcrumbing e a repetição do afeto insuficiente: um olhar psicanalítico sobre a carência e o reconhecimento.

      O  breadcrumbing  pode ser compreendido como uma metáfora potente de dinâmicas inconscientes profundas, nas quais manifestações intermitentes de afeto operam como migalhas: pedaços afetivos que, mesmo quando colhidos, não bastam para preencher antigas lacunas psíquicas. Ao ser examinado sob a lente da psicanálise, revela-se como expressão de uma repetição patológica que remonta a vínculos primordiais marcados por ausência, instabilidade e desamparo emocional.     Na perspectiva de Winnicott, a experiência de ser verdadeiramente reconhecido — acolhido em sua inteireza, com falhas e potências — depende da presença de um ambiente suficientemente bom. Esse espaço relacional funciona como espelho, permitindo ao sujeito reconhecer e integrar suas partes fragmentadas, aceitando a imperfeição como parte constitutiva do ser. O  breadcrumbing , no entanto, representa o inverso: uma alternância constante entre presença e ausência, que frustra a constru...

Diferenciando psiquiatria, psicologia e psicanálise: compreensão e singularidade.

      A compreensão do sofrimento psíquico atravessa diferentes campos do saber, especialmente a  psiquiatria , a  psicologia  e a  psicanálise . Cada uma dessas áreas possui fundamentos teóricos, métodos e finalidades distintas, embora compartilhem o compromisso com o cuidado à saúde mental. Psiquiatria: A abordagem biomédica.     A  psiquiatria  é uma especialidade da medicina voltada para o diagnóstico, tratamento e prevenção dos transtornos mentais. Fundamenta-se em um modelo biomédico, que entende as patologias psíquicas como fenômenos neurobiológicos, frequentemente tratados por meio de psicofármacos, intervenções clínicas e, quando necessário, hospitalização. O psiquiatra, portanto, alia conhecimento médico à escuta clínica, considerando sintomas e sinais sob uma ótica predominantemente orgânica e objetiva. Psicologia: O estudo científico do comportamento.     Por sua vez, a  psicologia  é uma ciência dedi...
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