Para
muitos pais dizer “não” é uma tarefa
difícil, mas é extremamente importante para o desenvolvimento da criança ouvir
esta pequena palavra. Disciplinar a criança em casa sempre que necessário evita
que ela sofra ao ser repreendida pelo mundo. Por mais difícil que pareça, dizer
não para os filhos é necessário e ajuda a evitar complicações sérias na vida
dos pequenos, agora e quando forem adultos. A mestra em educação e filósofa,
Tânia Zagury explica que “quando desde
pequeno, não se ensina ao filho que há coisas que ele pode fazer e outras não,
ele se tornará uma pessoa que não compreende a sociedade”. Crianças que não
têm o costume de ouvir “não” podem
desenvolver um comportamento exigente, temperamental e até exibir dificuldades
de relacionamento.
Em
1762 o filósofo Jean-Jacques Rousseau no livro “Emílio ou Da Educação” disse: “sabe
qual é a maneira mais certa de deixar seu filho infeliz? Acostumá-lo a receber
tudo.” Segundo Rousseau, se você der tudo a uma criança, seus desejos só
farão crescer devido à facilidade em satisfazê-los e ela terá de lidar com sua
própria ansiedade, com sua tirania e com a decepção do pai em algum momento
parar de atendê-lo, já que satisfazer tudo é impossível, pois “são sentimentos muito mais difíceis de
administrar para uma criança, e que causam mais dor do que simplesmente ter um
desejo negado”, conclui Rousseau.
Ao
proferir três palestras sobre o “dizer
não” o pediatra, psiquiatra e psicanalista infantil Dr. Donald W. Winnicott
demonstra sua sensibilidade no trato com crianças e seus pais, deixando claro
que existe uma necessidade de os pais saberem impor limites aos filhos, pois
até então os pais oferecem proteção incondicional ao bebê. Winnicott via esse “não” como a noção de confiança que aos
poucos é assimilado pelo bebê, de modo que a criança ao perceber que a mãe
sobrevive aos seus ataques e pode continuar a lhe dizer não, fica mais
tranquila. Sendo assim, dizer não é ajudar os filhos a fazerem distinção entre
o eu e o outro. Ao dizermos “não”
para a criança estamos expressando para ela o nosso desejo: “eu não quero que você faça isso...”
Existe um ditado popular que diz: “criança
não tem querer”. Isso porque o limite delas é o querer dos pais. Todavia, nunca
devemos dizer “não pode”, porque logo
ela perceberá que pode. Por esta razão o limite é o desejo de quem cuida e este
desejo para a criança está acima da lei: “eu
não quero que você mexa aqui. Por que não quer? Porque não quero!”. Entretanto, o desejo dos pais não é
autoritário! O autoritarismo seria algo assim: “vá tomar banho e se chorar apanha”.
Agindo
com autoritarismo não estamos permitindo que o sistema límbico da criança entre
em ação. O sistema límbico (região no cérebro constituída principalmente de
neurônios) é a unidade responsável pelas emoções e comportamentos sociais. Quando
o sistema límbico faz a sua volta completa (começo, meio e fim) ele cria um
mecanismo que a natureza não nos dá, só o psiquismo dá. Se chama autoestima. E
o que é autoestima? Autoestima é a possibilidade ética de gostar de si mesmo.
Logo, a pessoa sem autoestima procura na estética um jeito de gostar de si. Por
isso nosso país é recordista em implantação de silicones em adolescentes de 14
e 15 anos porque não gostam do nariz, dos lábios, orelha... Ao fazerem tudo no
lugar dos filhos ou sendo permissivos demais, os pais promovem nas crianças um
descrédito na sua própria capacidade. Em outras
palavras, autoestima é o julgamento; a apreciação que cada um faz de
si mesmo; sua capacidade de gostar de si.
Além
de seres psíquicos, somos também seres biológicos e é o córtex pré-frontal que
nos dá, ou não, o juízo crítico. Quando funciona? Na frustração. O limite é a
frustação a criança. Daí o juízo crítico dá a capacidade de parar de fazer mal
a si e para o outro. Nós erramos porque confundimos frustração com sofrimento.
Os estudos mais recentes na neurologia, neurociência, psicologia e psicanálise
comprovam que frustração é um bem, pois suportar a frustração gera crescimento.
Sendo assim, dizer não pelo desejo dos pais não é autoritarismo é saúde mental!
O
historiador brasileiro Leandro Karnal diz que esta é “a geração mais mimada da história”. Segundo ele, faltam marcos positivos, como a
ausência de castigos físicos, e alerta para aspectos importantes: a ausência de
limites e o fato dos pais cederem sempre, “à
manha e ao mimo”. Quando dizemos não para uma criança “eu não quero que você mexa aqui” estamos acionando o sistema
límbico dela e este sistema gera nela a raiva. Às vezes não conseguimos suportar
a raiva dos nossos filhos porque gera culpa em nós, ou às vezes estamos
cansados porque passamos o dia todo suportando a raiva do patrão, clientes... e
em casa vem o filho de 4 anos fazendo birra, não demora muito e logo dizemos: “deixa ele, depois a gente corrige”.
Grande
parte das crianças vive atualmente uma infância curta, uma longa adolescência e
se tornam adultos que não sabem escolher, optar, corrigir seus erros e se
responsabilizar por eles. Vivem de modo ansioso e inseguro do berço à adolescência,
segundo o exemplo familiar. Passam de crianças mimadas a adultos frustrados,
que não conseguem abandonar o modelo infantil ao se relacionar com a realidade,
andando sobre ilusões. Resta agora aos pais se conscientizarem e tentarem mudar
a situação ou esperar para ver – e pagar – os prejuízos, na próxima geração.
Lembre-se: é saudável dizer não aos filhos!
Daniel Lima
Psicanalista
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